segunda-feira, 26 de maio de 2008

Confidências



Um dos poucos objetos do meu passado que guardo com cuidado é uma máquina de escrever da Olivetti. Talvez porque, nos momentos de desconfiança, eu pense que o único aprendizado "acadêmico" realmente útil da minha vida tenha sido o cursinho de datilografia do Senac.

Nesta semana, tive dúvida se já havia apresentado minha Olivetti para a Júlia.

"Filha, você conhece uma máquina de escrever?"
"Claaaaarrrro, papai!"
"Você viu a máquina do papai?"
"Você tem uma?", ela perguntou espantada.
"Tenho.Não foi ela que você viu?"
"Não, papai. Eu vi uma máquina na excursão que a escola fez a um museu"



Se a Júlia conheceu uma máquina de escrever em um museu (quantos trabalhos de escola eu fiz na minha velha Olivetti!), o que dizer do meu primeiro e único aparato mais ou menos parecido com um vídeo-game: o telejogo.

Pra Júlia eu não vou perguntar. Mas, e você: conheceu o telejogo? Se não teve esta oportunidade, não sabe o que perdeu. Nem se comparava a um... atari, mas como era bom jogar tênis girando dois seletores parecidos com aqueles de aumentar o volume das antigas TVs.

Ainda que o presente seja maravilhoso, o passado sempre nos atormenta com suas pequenas coisas. A vida é muito mais um passeio de carrossel do que uma viagem por uma auto-estrada.

Gosto de olhar para trás, às vezes com alegria, às vezes com dor, mas sempre valorizando a saudade.

Estou me lembrando de Drummond

CONFIDÊNCIA DO ITABIRANO

Alguns anos vivi em Itabira.
Principalmente nasci em Itabira.
Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.
Noventa por cento de ferro nas calçadas.
Oitenta por cento de ferro nas almas.
E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,
vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.

E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,
é doce herança itabirana.

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:
esta pedra de ferro, futuro aço do Brasil,
este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;
este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;
este orgulho, esta cabeça baixa...

Tive ouro, tive gado, tive fazendas.
Hoje sou funcionário público.
Itabira é apenas uma fotografia na parede.
Mas como dói!

10 comentários:

Sandra Leite disse...

Ronaldo, Ronaldo

Estou aqui te esperando no escritório :P

Enquanto você não chega leio suas confidências...fase de memórias, heim? Eu também...
Será que é a sindrome dos 40???

beijos

Ronaldo Martins disse...

Sandra,
Estou crendo que esta síndrome existe mesmo.

Anônimo disse...

Caro Jornalista-Saudoso,

É tocante p/mim pensar em Olivettis em um momento destes. Meu pai tinha uma, comprada em 1971, cuja nota fiscal nunca jogou fora, e que ele usou até o dia de ir ao hospital, de onde náo sairia. Foi na Olivetti q ele deixou suas instruçoes finais.Ele até usava computador, mas nao dispensava a máquina para as anotaçoes.
Durante o velório, minha filha e a prima (9 e 8 anos, respectivamente) perguntaram se não enterraríamos a máquina com o avô (esta era uma brincadeira q fazíamos c/ele). Eu respondi que se fôssemos egípcios, que enterravam os bens + preciosos com os mortos, faríamos isto. Mas, ao invés disto, pegaríamos a Olivetti e a converteríamos em uma floreira. Assim o fizemos. Hoje, lá em no escritorio, há um pé de flores na Olivetti de Seu Amós.

Somos o que guardamos na vida, somos nossos "souverines". Somos o legado de nossas lembranças. Certamente vc guarda esta máquina por muitos motivos, alguns deles provavelmente até desconhecidos.

Tenho impressão de q meu pai guardou a Olivetti (que tem + ferro do que um carro popular hj:->) pq ela lembrava-o de um mundo que ele controlava, organizado, no qual ele detinha o poder (de datilografar rápido, de corrigir a produção) diferentemente de um computador/impressora no qual vc é muito + dependente da máquina.

A tendencia da nossa sociedade de consumo intensivo e ciclos tecnoloógicos cada vez + curtos é gerar muitas "olivettis", diversos faróis de um tempoo que não existe mais e insiste em viver em nós. Só não sei se teremos + a capacidade de deixar estas pistas ou se trocaremos nossas olivetis pela efemeridade e superficialidade.
um ab
edu

Ronaldo Martins disse...

É, meu caro Eduardo,
em homenagem a seu Amós, vou tentar escrever algum poema na minha Olivetti. Creio que ela ainda funciona muito bem. Não sei se vai ser fácil encontrar fita nova. Acho que cartucho não cabe lá :-)
Grande abraço,
Ronaldo

Anônimo disse...

hehehe

eu tenho só 10 anos a menos que você, e também tive uma Olivetti portátil, que virava uma maletinha, pra carregar!

Agora, essa do telejogo, o avô do Atari, eu sequer sabia que existia... auhauha

telejogo... que supimpa! (pra usar um termo de 40 anos atrás... hehehe)

Ronaldo Martins disse...

Jasão,
Você que é um jovem saudosista iria adorar o telejogo.

disse...

Fiz muitos trabalhos na boa e velha 'máquina de escrever'.
O telejogo não tenho muita certeza se conheci. lembro do meu irmão mais velho jogando tênis com um amigo numa imagem azulada com bonequinhos de risco único. Será que era esse?
Saudades da minha infância, onde se aprendia o novo com mais facilidade.
Hoje queimo a 'mufa' até para coisas simples no computador.
Meu blog está lá, 'simplezinho', sem nem um link!!
SIM, isso é um pedido de SOCORRO aos amigos blogueiros daqui: como faço para 'modernizar e expandir' meu blog???
rsrs
Abraços a todos

disse...

Obs.:
Me emocionei com a floreira na Olivetti do seu Amós...

Ronaldo Martins disse...

Renata,
Com certeza, seu irmão jogava o telejogo.
Abs,
Ronaldo

Anônimo disse...

eu sou um blogueiro chato que não atualiza o próprio blog, mas adora pedir atualizações nos blogs dos amigos...

...entendeu?

hhehehe

abraço