sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Um grito


("O grito", Munch)

Hoje eu vou gritar: NÃO GOSTO DOS HIPÓCRITAS.

Como defini-los? Jesus os chamava de "sepulcros caiados". Gente que sempre se apresenta com uma falsa beleza, mas tem o coração apodrecido.

Para gritar contra a hipocrisia, sugiro a canção do Cazuza. Tenhamos piedade dos hipócritas!


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Blues da Piedade

Agora eu vou cantar pros miseráveis
Que vagam pelo mundo derrotados
Pra essas sementes mal plantadas
Que já nascem com cara de abortadas
Pras pessoas de alma bem pequena
Remoendo pequenos problemas
Querendo sempre aquilo que não têm
Pra quem vê a luz
Mas não ilumina suas minicertezas
Vive contando dinheiro
E não muda quando é lua cheia
Pra quem não sabe amar
Fica esperando
Alguém que caiba no seu sonho
Como varizes que vão aumentando
Como insetos em volta da lâmpada
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Pra essa gente careta e covarde
Vamos pedir piedade
Senhor, piedade
Lhes dê grandeza e um pouco de coragem
Quero cantar só para as pessoas fracas
Que estão no mundo e perderam a viagem
Quero cantar o blues
Com o pastor e o bumbo na praça
Vamos pedir piedade
Pois há um incêndio sob a chuva rala
Somos iguais em desgraça
Vamos cantar o blues da piedade
Vamos pedir piedade...

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Os sinais da Primavera


A primavera está começando e, quando o assunto são as estações do ano, a gente logo é levado a uma conclusão: está cada vez mais difícil enxergar de forma definida as características de um e outro tempo. O frio já não marca data para chegar, a chuva vai e vem sem que a gente possa estar preparado e nunca existe a certeza de quando começa o verão. Os mais velhos afirmam que nem sempre foi assim. Os meteorologistas concordam e chegam a dizer que o ser humano é responsável por tudo isso. Não conseguimos mais vivenciar as características particulares de cada estação do ano porque interferimos de forma irresponsável na natureza.

As reflexões deste despertar da primavera me fazem voltar para dentro de mim mesmo e perceber que nós também já não temos a clareza sobre as diversas estações pelas quais passamos em nossas vidas. Quando o autor de Eclesiastes diz que “há tempo para tudo” em nossa vida, ele tenta nos alertar para o fato de que devemos compreender cada momento e encarar de frente suas singularidades. Se há morte, ela deve ser uma possibilidade de renascimento; se há angústias, elas devem apontar para o futuro; se há dor, ela pode criar a expectativa da alegria.

Será que conseguimos perceber isso? Talvez a nossa vida esteja como as estações do ano. Não sabemos distinguir uma crise da outra, uma alegria da outra, uma dor da outra. Parafraseando os Titãs (para quem “miséria é miséria e riquezas são diferentes”), eu diria que a morte nunca é a mesma, os momentos de felicidade trazem sentimentos diferentes, as angústias apontam para caminhos sempre novos e os sofrimentos ou a esperanças também não são os mesmos.

Se o ser humano é o responsável pelo desequilíbrio da natureza, que desfez a lógica das estações, quem nos roubou a capacidade de compreender os ciclos da nossa vida? Desconfio de que ainda não nos demos conta da relevância desta questão. A sociedade está passando por uma transformação fundamental, que tem como uma das características básicas a perda de referenciais. Há um turbilhão de dúvidas e de possibilidades que nos leva para todos os lados, mas não constrói pontos de contato sobre os quais possamos apoiar. Pode não ser fácil entender este momento, mas cada um de nós deve saber que “há tempo pra tudo”.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

As buscas e as respostas II


Nunca confiei nos remédios. Talvez porque eu nunca tenha tido enxaqueca, precisando recorrer à Neosaldina, como muita gente que conheço.


O fato é que os remédios são coisas. Concretas. A gente toca.


Acho que algumas pessoas se sentem muito mais aliviadas quando podem perceber um ponto de contato com aquilo que vai curar do que quando existe algum efeito real a ser notado.


Talvez, por isso, haja clientes de garrafadas.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Da incoerência de nossas ações


Descobri este texto do Montaigne nesta semana. Achei bastante interessante. Compartilho da idéia de que é sempre necessário ter um projeto de vida, ainda que seja o projeto de não ter projeto.


Não é de espantar, diz um autor antigo, que o acaso tenha tanta força sobre nós, pois por causa dele é que existimos. Quem não orientou sua vida, de um modo geral, em um determinado sentido, não pode tampouco dirigir suas ações. Não tendo nunca uma linha de sentido, não lhe será possível coordenar e ligar uns aos outros os atos de sua existência. De que serve fazer provisões de tintas se não se sabe o que pintar?

Ninguém determina do princípio ao fim o caminho que pretende seguir na vida: só nos decidimos por trechos, na medida em que vamos avançando. O arqueiro precisa antes escolher o alvo; só então prepara o arco e a flecha e executa os movimentos necessários; nossas resoluções se perdem porque não temos um objetivo predeterminado. O vento nunca é favorável a quem não tem um ponto de chegada previsto (...)

Nossa maneira habitual de fazer as coisas está em seguir os nossos impulsos instintivos para a direita ou para a esquerda, para cima ou para baixo, segundo as circunstâncias. Só pensamos no que queremos no próprio instante em que o queremos, e mudamos de vontade como muda de cor o camaleão. O que nos propomos em dado momento, mudamos em seguida e voltamos atrás, e tudo não passa de oscilação e inconstância. (MONTAIGNE)

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

As buscas e as respostas


Penso que o mundo sempre foi assim. A necessidade de encontrar sentidos para as questões particulares da vida faz com que as pessoas recorram a toda sorte de caminhos. Basta isso para que outros ofertem possibilidades de respostas.


Quando eu vejo cartazes como o do "Profeta Luis Claudio" não fico indignado ou revoltado. Apenas paro e reflito sobre a condição humana.


Somos frágeis e queremos alguma certeza que não se desmanche no ar.


Para provar que este "Armazém da Fé" não é coisa apenas de pastores, profetas, padres ou apóstolos, irei postar outras fotos em breve.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

A flor e a náusea


Por sugestão de meu amigo Eduardo Nunes, uma poesia de Drummond para embalar nossos dias lúgubres.


Preso à minha classe e a algumas roupas, vou de branco pela rua cinzenta.

Melancolias, mercadorias espreitam-me.

Devo seguir até o enjôo? Posso, sem armas, revoltar-me?

Olhos sujos no relógio da torre:

Não, o tempo não chegou de completa justiça.

O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera. (...)

Em vão me tento explicar, os muros são surdos.

Sob a pele das palavras há cifras e códigos.

O sol consola os doentes e não os renova.

As coisas.

Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.

Vomitar esse tédio sobre a cidade.

Quarenta anos e nenhum problema resolvido, sequer colocado.

Nenhuma carta escrita nem recebida.

Todos os homens voltam para casa.

Estão menos livres mas levam jornais e soletram o mundo, sabendo que o perdem

Crimes da terra, como perdoá-los?

Tomei parte em muitos, outros escondi.

Alguns achei belos, foram publicados.

Crimes suaves, que ajudam a viver.

Ração diária de erro, distribuída em casa.

Os ferozes padeiros do mal.

Os ferozes leiteiros do mal.

Por fogo em tudo, inclusive em mim.

Ao menino de 1918 chamavam anarquista.

Porém meu ódio é o melhor de mim.

Com ele me salvo e dou a poucos uma esperança mínima.

Uma flor nasceu na rua!

Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.

Uma flor ainda desbotada ilude a polícia, rompe o asfalto

Façam completo silêncio, paralisem os negócios, garanto que uma flor nasceu.

Sua cor não se percebe.

Suas pétalas não se abrem.

Seu nome não está nos livros.

É feia.

Mas é realmente uma flor.

Sento-me no chão da capital do país às cinco horas da tarde e lentamente passo a mão nessa forma insegura.

Do lado das montanhas, nuvens maciças avolumam-se.

Pequenos pontos brancos movem-se no mar, galinhas em pânico.

É feia.

Mas é uma flor.

Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Julgamento no Congresso


Livre interpretação do Livro do Profeta Amós (Cap. 2: 6-16)


Assim diz o Senhor: por três crimes no Senado e pelo quarto, eu não vou perdoar. Vocês compram a consciência dos justos por dinheiro e trocam votos por um par de sandálias; pisam os mais fracos e se desviam do caminho dos pobres. Em todos os altares de Brasília, se deitam sobre as dívidas do povo e, nos Palácios do poder, festejam à custa do fardo que impõem à Nação.

Vocês embriagaram os colegas de bancada que ainda queriam acreditar na ética e taparam a boca de quem gostaria de gritar contra a corrupção. Pois eu vou abrir o chão debaixo de vocês, como se uma carreta carregada de gado estivesse atravessando a Esplanada. O mais veloz não vai conseguir fugir. A valentia de alguns não vai adiantar de nada. Nem o que se acha muito forte vai escapar. Neste dia, o mais corajoso vai tentar fugir.

Oráculo do Senhor!

quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Amazônia, uma região de poucos

Este é um vídeo produzido pelo Greenpeace. Vale a pena assistir.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Sentimento do mundo


Um Drummond pra refletir nesta segunda:


Sentimento do mundo


Tenho apenas duas mãos

e o sentimento do mundo,

mas estou cheio de escravos,

minhas lembranças escorrem

e o corpo transige

na confluência do amor.


Quando me levantar, o céu

estará morto e saqueado,

eu mesmo estarei morto,

morto meu desejo, morto

o pântano sem acordes.


Os camaradas não disseram

que havia uma guerra

e era necessário

trazer fogo e alimento.

Sinto-me disperso,

anterior a fronteiras,

humildemente vos peço

que me perdoeis.


Quando os corpos passarem,

eu ficarei sozinho

desfiando a recordação

do sineiro, da viúva e do microscopista

que habitavam a barraca

e não foram encontrados

ao amanhecer


esse amanhecer

mais noite que a noite.