segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

As "sem" razões do amor


Tirei férias, do trabalho e do blog. Nesse período, resolvi ler sobre um tema que tem me interessado: o amor. Meu objetivo é reencontrar os caminhos desta palavra esvaziada de sentidos. Nos próximos dias, vou postar algumas coisas sobre o tema.

Quero começar pensando na possibilidade de que o amor seja mais dar que receber. Ou, numa comparação filosófica, mais spinozista do que platônico.

Sobre isso, duas citações. A primeira, do grande sábio dos sertões, Riobaldo Tatarana, referindo-se à amizade:

“Ah, não; amigo, para mim, é diferente. Não é um ajuste de um dar serviço ao outro, e receber, e saírem por este mundo, barganhando ajudas, ainda que sendo com o fazer a injustiça aos demais. Amigo, para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou o- amigo – é que a gente seja, mas sem precisar de saber o por quê é que é”.

Agora, Pavese: “Você será amado no dia em que puder mostrar sua fraqueza sem que o outro se sirva dela para afirmar sua força”

Seguido do comentário de Sponville:“Esse amor é o mais raro, o mais precioso, o mais milagroso. Se você recua um passo, ele recua dois. Simplesmente para lhe dar mais lugar, para não esbarrar em você, para não o invadir, não o oprimir, para lhe deixar um pouco mais de espaço, de liberdade, de ar, e tanto mais quanto mais fraco o sentir, para lhe impor sua potência, nem mesmo sua alegria ou seu amor, para não ocupar todo o espaço disponível, todo o ser disponível, todo o poder disponível...”

Não é fácil aprender a amar assim, como tentam ensinar os cristãos. Eles proclamam que Deus é amor. Será que podemos aprender algo com esta afirmativa? Vou falar sobre isso depois.

9 comentários:

Anônimo disse...

Bonito, amigo!

Você é um desses a quem posso verdadeiramente chamar de amigo. Um dos poucos a quem posso abrir o coração e contar todas as minhas fraquezas, como já o fiz em tantas oportunidades, sem medo de nada.
De qualquer modo, o fato de que os cristãos insistem em pregar o amor e pouco conseguem vivê-lo é que o cristianismo é mesmo difícil de se viver. A proposta de de Jesus era: "aquele que quizer ser o maior seja antes o servo" (alguém dá conta disso?)"se te bateres numa face, oferece a outra"(alguém dá conta disso?)"Orai pelos que vos maltratam e bendizei os que vos maldizem" (alguém dá conta disso?)etc,etc,etc.
E o pior é que Deus vê o nosso interior, ou seja, as máscaras não adiantam de nada.
A bem da verdade, acho que o mal desse século está na inversão dos nossos valores: cada vez mais amamos as coisas e usamos as pessoas.
Um abração,
do Xandão

Ronaldo Martins disse...

Não some não, cara.
Abs,
Ronaldo

Anônimo disse...

finalmente texto novo por aqui!

aguardemos, então, ansiosamente, a continação das suas reflexões, meu caro...

abraço!

Sandra Leite disse...

Aleluia, Ronaldo!

Como disse o Jasão "texto novo aqui". Você faz falta com suas provocações e reflexões - muitas das quais eu não concordo, mas...toda a unanimidade é burra, certo?;)
Olha só, de uns tempos pra cá penso que o ser que ama, ou seja, o sujeito da ação é mais "poderoso" (a palavra não é bem essa) do que o que é objeto do amor.
Amar nos fragiliza e ter a coragem de expor a todos os sentimentos geração é um tanto mais complicado.
Abaixo vem uma das mais belas poesias...pra variar, mineiro, Drummond.

Amor - pois que é palavra essencial - Drummond

"Amor – pois que é palavra essencial comece esta canção e toda a envolva.

Amor guie o meu verso, e enquanto o guia,reúna alma e desejo, membro e vulva.

Quem ousará dizer que ele é só alma?Quem não sente no corpo a alma expandir-se até desabrochar em puro grito de orgasmo, num instante de infinito?

O corpo noutro corpo entrelaçado,
fundido, dissolvido, volta à origem
dos seres, que Platão viu completados: é um, perfeito em dois; são dois em um.

Integração na cama ou já no cosmo?
Onde termina o quarto e chega aos astros? Que força em nossos flancos nos transporta
a essa extrema região, etérea, eterna?

Ao delicioso toque do clitóris,
já tudo se transforma, num relâmpago. Em pequenino ponto desse corpo,a fonte, o fogo, o mel se concentraram.

Vai a penetração rompendo nuvens
e devassando sóis tão fulgurantes
que nunca a vista humana os suportara,mas, varado de luz, o coito segue.

E prossegue e se espraia de tal sorte que, além de nós, além da prórpia vida, como ativa abstração que se faz carne, a idéia de gozar está gozando.

E num sofrer de gozo entre palavras, menos que isto, sons, arquejos, ais, um só espasmo em nós atinge o climax: é quando o amor morre de amor, divino.

Quantas vezes morremos um no outro, no úmido subterrâneo da vagina,nessa morte mais suave do que o sono: a pausa dos sentidos, satisfeita.

Então a paz se instaura. A paz dos deuses,estendidos na cama, qual estátuas vestidas de suor, agradecendo o que a um deus acrescenta o amor terrestre."


Eu entendo o amor a partir da poesia, Ronaldo!

abs,

Ronaldo Martins disse...

Sandra,
O que eu amo quando amo alguma coisa? Talvez ame a mim mesmo. Você tá certa: é claro que quem ama é mais importante. Spinoza diz que o amor é uma alegria acompanhada de uma causa exterior. O objeto (para usar sua linguagem) é só a causa de algo que acontece dentro da gente, seja algo bom ou ruim. O amor nos fragiliza? É sobre isso que falarei no meu próximo post. Você vai ver que estamos seguindo na mesma direção.
Abs,
Ronaldo

Sandra Leite disse...

Ronaldo,

" Você tá certa: é claro que quem ama é mais importante"

Mais importante, não acho.
Mais corajoso com certeza!!!!

Anônimo disse...

Caro,
Como já disse Jasão, finalmente texto novo. E texto bom. Assunto bom. Bom de tão difícil. Você é que é o especialista espinoziano (junto com a Chauí), mas talvez um caminho para falar sobre o amor em Espinoza não seja contrapô-lo a outros conceitos, seja completa-lo. Isto deve ser a armadilha deste tema: que o amor é multifacetado. Por certo meu caro jornalista-filófoso, há muito que nossa sociedade vem se focando apenas nos aspectos de amor-sentimento, ou do amor como sentido de auto-esvaziamento, ou ainda do amor como sinônimo de desejo do que é belo, perfeito (amor como superação do indivíduo através da projeção para algo que é melhor do que nós).
Estas visões são míopes e Espinoza percebeu. Mas, ao invés de reconceituar o amor de construir outro conceito e, assim, cair na armadilha clássica de aprisionar o conceito como se ele pudesse existir sem seus agentes, o melhor é seguir o caminho Riobaldiano e não definir o amor, mas, no máximo, descrever suas manifestações.
Welcome back à blogsfera
Edu

Ronaldo Martins disse...

Concordo, Edu.
Estou tentando trabalhar um texto nesta linha. O amor é um mosaico. Eu estou chamando de uma militância.
Não sei quando vou conseguir escrever isso, mas estou tentando.
abs,
Ronaldo

Sandra Leite disse...

Amor é sentimento , Ronaldo. Pode até ser uma militância, mas prioritariamente é sentimento